Por Marcello Comuna
Tenho andado sem paciência. Optei em fazer nada ao invés de ficar fazendo o mais do mesmo. Meu tempo é precioso demais e eu não sei quanto tempo tenho para ficar enxugando gelo. Não consigo mais ficar fingindo. Lembrei de uma música que diz: "Gente que tem coragem não finge". Letra do Rodolfo Abrantes, um cara de coragem que parou de fingir que era feliz no Raimundos e seguiu outro rumo, mesmo tomando muita pedrada dos "amigos". Tô nessa aí também, até encontrar meu lugar ao sol. Estou investigando.
Não tenho mais saco para o hedonismo bobo e vazio do sexo drogas e rock n' roll. Nem tão pouco para a ilusão de uma vida cheia de dogmas impostos pela religiosidade de qualquer religião. Conheci um negócio chamado Graça Divina e não tenho mais como voltar atrás. A Graça é plural em cor, som, gosto e forma. As religiões dos homens são monocromáticas.
Isso é bem notório na escolha do repertório das músicas que
são tocadas nos cultos. Quando questionados, muitos líderes e pastores afirmam
que a música não é escolhida para que a igreja goste, mas para que o Eterno se
agrade.
Bom, espero um dia alcançar a intimidade desses homens,
porque eles sabem até quais as músicas Deus gosta.
É lógico que não sabem. As músicas são escolhidas a partir do seu bel prazer ou de
experiências transcendentais com a divindade.
Na maior parte do senso coletivo religioso o momento de “adoração”
é aquele tempo em que a igreja adora a Deus através das canções, é quando as
pessoas tem a oportunidade de fazer suas declarações de amor e gratidão ao
Pai. Também é comum a ideia de que: “ é o momento em que os corações são
preparados para o recebimento da palavra”.
Então, se é o meu momento de cantar meu amor ao Mestre, é
mais do que óbvio que eu queira fazer isso com as canções que eu me identifique e aprecie.
Ou por acaso alguém faz uma serenata para a amada com músicas que não suporta?
Você já viu um roqueiro cantando um pagode para se declarar a sua namorada ou
vice versa?
Lógico que não.
Mas se a igreja é plural, como agradar a todos?
Acontece que esse comportamento monopoliza os gostos e castra a diversidade. A igreja que deveria ser um sinalizador da eternidade, um lugar com todas as tribos adorando ao Senhor e vivendo em harmonia, tornou-se um gueto de gente singular. Gente que fala igual, ora igual, se veste igual e ouve música igual. Ou seja, a igreja não é plural! Deveria ser, mas não é!
A preocupação não é agradar a todos, isso seria uma falácia.
O questionamento aqui é a falta de diversidade em nosso meio. Nossa nação tem
uma das culturas musicais mais ricas do mundo e ainda sim nossos encontros são
pobres de diversidade. Toca-se o mesmo ritmo sempre - e pior, um ritmo importado!
Quantas vezes você viu um berimbau na igreja? Uma percussão?
Uma sanfona? Uma gaita? Uma pick up? O quê rege as
adorações da sua igreja, a música popular brasileira ou música popular
americana? Sua igreja está cheia de versões das músicas estrangeiras ou dá espaço para os talentos nacionais?
A educação vem do púlpito. Enquanto o farol emitir a mesma cor de luz tudo será
mais do mesmo. Os músicos estão para servir a comunidade. A comunidade deve
ter o direito de opinar o que quer cantar ao Pai. Mas as comunidades se tornaram guetos de pessoas alienadas gravitando ao redor de pastores e líderes que não podem ser questionados.
A cada dia dezenas de pessoas começam a frequentar os cultos
evangélicos. A cada dia dezenas de pessoas entram no ciclo da singularidade medíocre.
Ok, Comuna! Me convenceu! O que devo fazer, então?
Aprenda com os bares! (Aí meu Deus! Ele escandalizou!)
Um músico de barzinho está ali para alegrar as pessoas com
belas canções. Os músicos da igreja devem ser guiados pelo mesmo principio:
Direcionar as pessoas a alegria musical de declarar-se apaixonadamente a Deus
com as músicas que elas gostam. Músico não é levita e nem alguém com função especial. Ele é servo como qualquer outro. Está ali para servir os irmãos que reuniram-se para ouvir reflexões sobre as Escrituras - que são o destaque da reunião. Música é complemento - cereja do bolo.
Músicos precisam abaixar a bola, principalmente líderes de louvor, que muitas vezes são os mais arrogantes de uma congregação. Parece síndrome de Lúcifer.
Enfim, de forma pragmática a mudança seria mais ou menos assim:
Crie uma caixa para coleta de sugestões de músicas;
Depois façam o filtro pelas letras. Elas devem ser sempre cristocêntricas;
A maioria do repertório deve ser em terceira pessoa. Somos uma COMUNIDADE cantando ao Pai. Precisamos de menos "meu pão" para termos mais "nosso pão".
Valorize a pluralidade dos ritmos;
Valorize a musicalidade brasileira. A fé é universal e as
igrejas devem se adaptar as culturas locais. Liberte-se do colonialismo
americano! Isso não quer dizer que não possa ter estilos gringos, mas eles não
devem priorizar reuniões feitas no Brasil;
(É tão óbvio que até me irrito em ter que explicar isso).
Valorize os compositores da igreja. Eu conheço um lugar onde
há talentosos compositores e nenhuma de suas canções são aproveitadas. Que desperdício
do dom alheio(!);
Incentive a busca pelo novo. Apresente novos artistas, principalmente os que não tocam nas rádios. Na maioria das vezes os melhores não estão lá;
Seja sincero com a congregação sobre as mudanças. Explique. Não tenha medo de parecer humano.
A priori essas são algumas ideias que veem a minha cabeça.
Isso não é uma receita de bolo. É apenas uma sugestão de caminho que pode ser
adaptada a realidade local.
Provavelmente sua igreja deva estar cauterizada com a
mesmice que você vem aplicando ou reproduzindo há anos. Então, comece devagar.
Traga o novo aos poucos. Insira duas músicas diferentes aqui, mais outra ali na
frente até alcançar a pluralidade. Fuja dos rótulos. Igrejas não devem ser
estigmatizadas como dos surfistas, dos skatistas, dos undergrounds, das pessoas
comuns e etc. Igreja é um grupo chamado para fora com todo o tipo de gente.
A tolerância com a diversidade deve partir de cima dos púlpitos. Como sua igreja irá aprender a conviver respeitosamente com a pluralidade se a cada encontro são feitas as mesmas coisas de sempre?
Se você está começando uma igreja, fuja dessa armadilha. Não precisamos de mais gente fazendo o mais do mesmo. Principalmente os desigrejados. Cuidado para não cometerem os mesmos erros dos seus pais usando apenas uma roupagem diferente pós moderna.
Se estou certo, que Deus te convença. Se estou errado, que Ele convença a mim.
Redenção e subversão em Cristo.